sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Vale a pena ler de novo: Mohamed Bouazizi - Primavera Árabe

Meu filho hoje chegou em casa, empolgado,  e me contou toda a história da primavera Árabe que aprendeu na escola. E como todo filho de peixe, peixinho é, ele pediu para que eu escrevesse a cerca da história de Bouazizi, que definitivamente, não teve o devido crédito nas mídias, por motivos bem óbvios. Bom, eu já havia escrito sobre o assunto no blog antigo, decidi então só incluir um vídeo e acrescentar uma ou outra coisa. Afinal, meu filho está certo: atitudes como as dele e o que desencadeou, não podem ser esquecidas.
Sem delongas, vamos ao artigo: 

  Mohamed Bouazizi ( nascido em 29 de março de 1984 - falecido em 4 de janeiro de 2011) ateou fogo a seu corpo no dia 18 de dezembro de 2010 mediante o desespero e humilhação acrescidos de anos de descaso e corrupção por parte da polícia e de seu governo.
Aos 3 anos, Bouazizi  perdeu seu pai e como membro masculino em uma sociedade patriarcal, aos 10 anos, assumiu o peso da responsabilidade. Como muitos, ele estudava acreditando que  isso futuramente lhe promoveria uma maneira digna de sustentar sua família enquanto trabalhava,após a escola, vendendo frutas e legumes com um pequeno carrinho nas ruas de seu bairro. 
Mesmo depois de ter estudado, não conseguiu um emprego formal e então decidiu dedicar-se integralmente em suas vendas para complementar a renda de sua família.

Ao longo de sua vida, sofreu  tentativas de extorção além de ter tido seus produtos roubados inúmeras vezes pelos guardas locais. Certo dia, as autoridades locais deram ordem para que todos os produtos fossem confiscados alegando que a venda pelos ambulantes na Tunísia fossem ilegais, (mesmo o ministro do trabalho afirmando que vendas como as dele não eram).
Vendo, mais uma vez, seu material de trabalho confiscado, decidiu então, pela primeira vez,  recorrer  e revindicar o seu direito e também a sua mercadoria.
Ao chegar lá, além do não , ele foi cuspido e agredido com um tapa por uma funcionária (mulher) municipal. Desesperado e mais uma vez humilhado, ele foi para casa, deixou uma mensagem para a sua mãe no Facebook, pedindo perdão por ter perdido a esperança em tudo. Comprou um diluente, retornou , encharcou-se e ateou fogo na frente da sede que havia recorrido, na presença dos funcionários (incluindo da mulher que lhe cuspiu) e de muitas outras pessoas que fotografaram e filmaram seu ato.
Sua atitude repercutiu nas redes sociais, assim como sua história ( que refletia a de muitos tunisianos) e  incitou o povo a lutar contra a corrupção, contra a falta de emprego e muitas outras coisas frutos do descaso de seu líder, o então presidente  Zine El Abidine Ben Ali - Ben Ali -  que já estava no poder há 23 anos. 
Uma das medidas tomadas por Ben Ali (imagem ao lado)  foi a de cortar a internet na esperança de conter as manifestações,  o que não adiantou. 
 Ele também foi visitar Bouazizi no hospital, ordenando que seus familiares se retirassem do local a fim de ser fotografado com o paciente que estava em coma induzido em função das queimaduras. No entanto, a imagem dos médicos incitou ainda mais a população e mesmo tentando implantar medidas para reduzir o desemprego entre outras, renunciou 10 dias após a morte de Bouazizi, fugindo para a Arábia Saudita.


Mais de  5.000 pessoas participaram da procissão funerária de Bouazizi.
Estimativas da ONU apontam que mais de 200 pessoas morreram e 500 ficaram feridas durante os protestos na Tunísia. Ben Ali hoje acompanha de longe o novo presidente que  coloca seus palácios à venda  com a promessa de usar o DINHEIRO para criar novos empregos...

Com o sucesso dos protestos na Tunísia, uma onda de instabilidade atingiu o norte da África e o Oriente médio:  a Argélia, Jordânia, Egito , o Iêmen e outros países. realizaram as maiores e mais organizadas manifestações que já se viu ultimamente. Manifestações estas que ganharam forças através das mídia sociais e que transcenderam a elas quando o governo cortava o sinal de internet .

As revoltas que aconteceram  na Tunísia e de certo modo no Egito, merecem destaque pois foram revoltas populares, ou seja, o povo que , cansado com as condições de vida, se rebelaram e manifestaram-se contra o governo.  Vale citar que no Egito, o presidente Hosni Mubarak (após 30 anos no poder) renunciou em 11 de fevereiro de 2011. 
No caso da Líbia, podemos observar que perdeu-se um pouco o caráter puramente  "popular" quando rebeldes insatisfeitos com o governo (minoria da população), aproveitaram o momento também para protestar mas  com o apoio "externo" (financiados pelos EUA). Após 42 anos no poder, o ditador Muamar Kadafi foi morto pelos rebeldes depois de uma dura caçada que levou o país a uma verdadeira guerra; no entanto, após sua morte, parece que  a situação do país piorou ... 
 Pequeno vídeo sobre Bouazizi:

A primavera Árabe ainda não chegou ao fim... 
Em outubro de 2011, o Parlamento Europeu distinguiu cinco personalidades ligadas à Primavera Árabe, entre as quais Bouazizi, e  concedeu  a ele o Prémio Sakharov.
Bouazizi, em sua desesperança, levou milhares de pessoas a tomar coragem e lutar contra a tirania que os dominava, e o fato desses tiranos correrem como ratos, só nos revela o poder que o povo organizado possui.

Que  a atitude de Bouazizi , inspire o mundo a lutar contra o descaso da elite e do governo, tal qual fizeram os franceses famintos que se rebelaram diante dos cabelos em formato de navios de sua rainha...
Que nós, ao invés de atearmos fogo ao nosso corpo, não aceitemos mais a condição que nos é imposta, não aceitemos mais a corrupção e a tirania. Que lutemos, não de maneira manipulada, favorecendo a alguém ou a uma classe exclusivamente mas que lutemos pelo direito de termos uma vida mais digna, mais justa. Seja indo às ruas ou se recusando a votar, ou talvez tão somente não comprando determinados produtos em determinados lugares... há várias maneiras de se lutar e valer a morte de tantos em nossa história.
Enquanto permitirmos que corruptos nos governem, enquanto nós permitirmos que se morrem nas filas de um hospital implorando o atendimento que é pago com o nosso dinheiro (no caso do Brasil), enquanto nós nos vendermos nossa dignidade por uma ilusão, não viveremos, só sobreviveremos.
E não há nada pior do que isso. 
Que assim seja!
Abraços 
Salu.

http://noticias.terra.com.br/mundo/ha-um-ano-e-sem-saber-bouazizi-ateava-fogo-ao-mundo-arabe,3d98ec09b57da310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mohamed_Bouazizi
http://pt.wikipedia.org/wiki/Primavera_Árabe

1 comentário:

  1. Salu, ótimo texto.

    “A prisão não são as grades, e a liberdade não é a rua; existem homens presos na rua e livres na prisão. É uma questão de consciência.”
    ―Mahatma Gandhi

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